O cultivo da cana-de-açúcar e sua ação sobre o meio ambiente

O processo histórico de integração e uso das terras para produção de etanol e o que modificou-se com o decorrer do tempo em relação ao meio ambiente
Franciane Aparecida Marchiori
fran_markiori@hotmail.com

Doenças respiratórias, fuligem espalhadas por toda cidade, céus cinzentos, foi essa a realidade de muitas cidades durante anos em decorrência da queima da palha de cana-de-açúcar. Com o passar do tempo essas queimadas levaram prejuízos ao meio ambiente e as populações próximas às usinas de produção de açúcar e etanol. 

Foi na mitologia que apareceram as primeiras anotações sobre a cana-de-açúcar, essas foram encontradas em escrituras de povos hindus e também em sagradas escrituras, eram utilizadas como remédio e artigo de luxo, sua primeira ocorrência foi em Ilhas do Arquipélago da Polinésia. 

Sua introdução nas Américas ocorreu quando as caravelas começaram suas viagens, levavam a bordo mudas de cana-de-açúcar para que posteriormente fossem plantadas em novas terras servindo de suprimento as expedições futuras.  Cristóvão Colombo em 1493 foi o primeiro a trazer mudas para as Américas e depois no Brasil em 1502 por Martin Afonso de Souza, essas mudas eram originadas da Ilha da Madeira. Podemos relacionar o cultivo da planta com o decorrer da história do Brasil e seu desenvolvimento. 

Em 1887 se mostrou que era viável o melhoramento genético da cana-de-açúcar e com isso foram realizados vários cruzamentos e em 1889 foram criados os programas de melhoramento genético. O Brasil por muito tempo importou de outros países o resultado desses cruzamentos de cana-de-açúcar. 

As mudas de cana que são plantadas no mundo são resultado da hibridização presente no banco de germoplasma de cada instituição de pesquisa. Entrou-se em convenção que todos os híbridos seriam chamados de variedades e os nomes que as variedades comerciais recebem é uma composição da sigla da instituição que realizou o cruzamento, seguido do ano que ocorreu hibridização e por fim um número sequencial em relação às seleções.

Ao decorrer da história o governo brasileiro tentou vários programas para que o setor sucroenergético fosse consolidado nacionalmente e internacionalmente, com isso houve uma grande expansão de recursos financeiros para o desenvolvimento, focando primeiramente a demanda nacional pelo açúcar e também pelo aumento dos automóveis movidos a etanol, que até então era conhecido como álcool. Os principais planos foram o Programa do Proálcool, Proinfa (Programa de Incentivo ás fontes alternativas de Energia Elétrica) e o Plano Nacional de Agroenergia.  

O Proálcool foi instituído pelo decreto Lei n.25.174-A de 3 junho de 1948 e com ele foram propostos os incentivos à produção de etanol, sendo que o uso era direcionado a motores de combustão. Em 1975, conhecemos o Programa nacional do álcool, que marcou pelo alto preço do petróleo, havendo o primeiro choque do petróleo, neste momento também se pensou no meio ambiente visando que o efeito da utilização do etanol como combustível diminuiria a emissão de monóxido de carbono, tudo isso foi proposto por especialistas em tecnologias, empresários e acadêmicos.

Já o Proinfa, decretado pela lei n. 10.438, de 16 abril de 2002, tem características de sustentabilidade, que utiliza o resíduo para produção de energia elétrica. O principal fato é suprir a necessidade local e quando esta já for suprida se comercializar o restante.   

Por fim, o último projeto é o Plano nacional de Agroenergia estabelecido 2006-2011 onde tende a promover o desenvolvimento sustentável e o uso racional de energia renovável.

As informações encontradas na revista Brasileira de Epidemiologia de 2006 mostra que o Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar, são 4.5 milhões de hectares para o plantio de cana-de-açúcar, este valor representa 1% das terras agricultáveis, onde 55% da safra são direcionadas a produção de álcool e seus subprodutos e os 45% para produção de açúcar. No estado de São Paulo se localiza cerca de 60% das plantações sendo 230 milhões de toneladas por e tende a crescer aumentando as áreas de plantio.

Toda cana plantada, tem que ser colhida, um dos métodos de colheita é a realização da queima do canavial, para reduzir a quantidade de folhas e também para que se reduza o risco com animais peçonhentos na hora do corte, após a queima.

Essa prática de queima traz muitos prejuízos ao meio ambiente (em âmbito local, regional e global), um deles é poluição do ar, essa poluição atinge comunidades inteiras levando prejuízos na saúde e ao meio ambiente, a queima traz uma fuligem preta para casas e por toda a cidade. Essa fuligem e a fumaça causam também outros tipos de problemas como acidentes nas rodovias tendo como causa a fumaça ocasionada pela queima, problemas respiratórios. No meio ambiente temos problemas como a evasão de animais nas áreas de queimada ou a queima dos mesmos, emissão excessiva de gases e também como a palha é queimada ela não é reaproveitada pelo solo e pelas usinas para produção de energia. 

A queima da biomassa leva a dois tipos de problemas em áreas ambientais, a poluição atmosférica e os impactos na saúde e na biodiversidade que limitam o desenvolvimento de ecossistemas, onde temos uma perda grandes de animais, pois esses muitas vezes são queimados ou se deslocam de certas reservas por causa da queimada.

Com o avanço tecnológico veio a necessidade desenvolver meios para que esses problemas decorrentes das queimadas fossem solucionados e com isso se estabeleceu um progresso e com grandes inovações. Inicialmente veio a ideia da cogeração, no qual o bagaço (produto resultante do processo de extração do caldo da cana) seria incorporado e queimado nas caldeiras consequentemente aumentasse o potencial de cogeração de energia, só que para que esse aproveitamento seja vantajoso à necessidade da mecanização do corte. Esse meio alternativo vem como respaldo para Lei Estadual n. 11.241, de 2003 que coloca uma meta de ate no ano 2021 para que as queimadas acabem em locais mecanizáveis e 2031 em áreas que não é possível fazer a colheita por mecanização. 

Hoje em dia, principalmente no estado de São Paulo, há grande utilização da colheita mecanizada, onde são utilizadas para muitos estudos, como o pesquisador Dinailson Corrêa de Campos demonstra que a produtividade com queima é somente 5% superior a colheita mecanizada.

A gestão moderna veio para aquelas indústrias que visam o mercado internacional e, portanto começa a melhorar nitidamente as condições trabalhistas, proporcionando programas na área de educação, alimentação e outros benefícios para os trabalhadores. Outro ponto a ser levantado é que as inovações tecnológicas (colheita de cana mecanizada) nem sempre fazem com que as condições insalubres acabem.

Ainda em muitos canaviais encontramos a queima ilegal da palha, mesmo que as condições de umidade do ar e de outros fatores ambientais como velocidade do vento não permitam que as mesmas ocorram.  

Analisando as áreas degradadas e a diversidade que estas têm, vemos que a expansão da cultura de cana-de-açúcar no período do Proálcool se deu em áreas que até então eram utilizadas para pecuária extensiva, sendo que houve pouca exploração de terras novas, a exploração veio mais recentemente com o crescimento e assim houve busca por novas regiões. Nessas novas regiões estão inclusas áreas naturais.   

A preocupação hoje é com a expansão sobre o cerrado, devido ser uma área predominante e com muitas riquezas. O que vemos é que muitos órgãos proteção ambientais estão exigindo estudos rigorosos sobre o impacto nesse ambiente, o processo para que uma nova usina ou destilaria possa ser autorizada leva mais de dois anos. Outro ponto faz com que essas terras sejam muito visadas é disponibilidade de mão-de-obra e a declividade das terras o que proporciona o poder de mecanização durante todo o processo.

Um ponto de expansão que hoje é na região do Estado Maranhão, onde o governo propôs programas, pois as condições nesses locais são ideias para as plantações e também para exportação, mas temos que lembrar que esta é uma região de divisa entre o Cerrado e a Amazônia.      

Portanto, temos que a grande preocupação ambiental é a expansão dos canaviais em regiões onde temos nosso bioma de cerrado, sendo que isso causaria grande impacto sobre o mesmo. Há também o problema da contaminação do solo e dos afluentes de corpos de água quando os dejetos produzidos não têm um destino certo, o resíduo mais preocupante é o vinhoto, que deve ser manejado de forma consciente para que não haja contaminação. Por fim não podemos nos esquecer do prejuízo que as queimadas trazem para a biodiversidade acabando com animais e plantas. Hoje o ponto muito interessante é que quase toda energia utilizada no setor sucroenergético é renovável, e os combustíveis fósseis nessa área são utilizados somente para mover motores que ainda necessitam desse combustível.

   

Leituras sugeridas

  • Rodrigues, D. and Ortiz, L. 2006 Em direção à sustentabilidade da produção de etanol de cana de açúcar no Brasil. Disponível em http://www.seer.ufu.br/index.php/revistaeconomiaensaios/article/view/157.... Acesso em Otubro de 2014.
  • Vian, C E F. e Gonçalves, D B. Modernização empresarial e tecnológica e seus impactos na organização do trabalho e nas questões ambientais na agroindústria canavieira. IN: Economia Ensaios. Vol. 22. N. 1. Uberlândia: EDUFU, 2007.