Imitando a natureza, produzindo sustentabilidade

Pressões para adoção de práticas mais adequadas ambientalmente no desenvolvimento de produtos e serviços levam ao amadurecimento de áreas como a bio
Andreza Lanza Braga
andrezalanza@gmail.com
Peixe-cofre (Lactoria cornuta)
(Foto: Drow male)
(Fonte: commons.wikimedia.org)

A natureza sempre foi e sempre será fonte infinita de inspiração para a humanidade. A partir dessa inspiração, a área denominada “biomimética” objetiva descobrir a organização estrutural de materiais biológicos e implementá-la na construção de materiais sintéticos de alto desempenho. Tanto um desafio de inovação em design quanto a observação da eficiência de fenômenos do mundo natural podem levar à atuação da biomimética, que evidencia a interação do desenvolvimento de produtos com a natureza.

Um produto desenvolvido recentemente a partir da biomimética é um carro conceito da Mercedes-Benz, o Bionic Car, baseado no peixe-cofre. Na busca por um modelo para o seu desenvolvimento, engenheiros foram atrás de diferentes organismos procurando a máxima eficiência em locomoção, identificando no peixe-cofre uma aerodinâmica corpórea eficiente, com excelente desempenho para sua sobrevivência nos corais onde habita. O chamado “efeito lótus” também é um exemplo de solução encontrada a partir da biomimética. Nesse caso, a observação das folhas da flor de lótus, que conseguem manter sua superfície lisa graças a microestruturas que impedem a absorção da água, foi a inspiração para o desenvolvimento de diversos produtos. Isso porque, ao entrar em contato com a folha da flor de lótus, a água escorre pelas estruturas, levando a sujeira embora, mecanismo que inspirou indústrias de tintas, tecidos, cosméticos e eletrônicos, facilitando a remoção de resíduos e oferecendo selagem pela ação de nanopartículas, assim como ocorre na planta.

Semente Arctium sp.
(Foto: Kalyanvarma)
(Fonte:  commons.wikimedia.org)

Essa linha de desenvolvimento do pensamento produtivo recebeu esse nome há poucos anos. No entanto, o homem reproduz a natureza em suas invenções desde os primórdios. Uma invenção inspirada na natureza não tão recente, mas sempre presente em nosso cotidiano, é o velcro, criado por Georges de Mestral, em 1948. Ele percebeu, após passeios com seu cão, que as sementes da planta Arctium sp. permaneciam aderidas em suas roupas e no pelo do cachorro. Estudando o mecanismo ali presente, pode vislumbrar a ideia do que seria um produto inovador.

Vinculando a biomimética à aplicabilidade em organismos vivos, temos os biomateriais, que podem ser sintéticos ou naturais, usados na reposição de tecidos, órgãos ou funções do corpo. Muitas das atuais pesquisas com biomateriais remetem à substituição do petróleo na produção de polímeros. Uma pesquisa desenvolvida no Brasil, sob a liderança de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), investiga, por exemplo, o uso de sementes de açaí como componente de próteses ósseas cranianas. Nesse caso, o poliuretano, derivado de petróleo, poderá ser substituído pelo plástico de açaí. Além de dispensar o uso do petróleo, a produção do polímero a partir de açaí daria finalidade a um material amplamente descartado e que, além disso, tem propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e analgésicas.

Compreendendo o significado de Ecodesign

O ecodesign caracteriza-se pelo pensamento sobre o ciclo de vida dos materiais e produtos, considerando as questões ambientais e sua incorporação em todas as fases de desenvolvimento e produção. Ele surgiu a partir da procura por soluções ambientais aos problemas derivados das técnicas do design tradicional, que levaram a algumas exigências relacionadas à minimização dos impactos. De outro lado, a implementação do ecodesign pode criar novas oportunidades nas empresas, através de abordagens inovadoras aos problemas, da agregação de valor ao produto e do auxílio à fixação da posição dessas empresas em um mercado cada vez mais competitivo e com exigências ecológicas.

Frente a esse imenso potencial de contribuição da natureza, que vai desde modelos inspiradores até a matéria-prima abundante, mas não infinita, é preciso que melhoremos o uso, rendimento e aproveitamento dos materiais. A partir dessa ideia, empresas têm implementado a prática do ecodesign (ver quadro), que visa incorporar critérios ambientais no desenvolvimento de produtos e serviços, buscando a minimização dos impactos ao longo de todo o seu ciclo de vida, desde a extração e síntese de matérias-primas até a deposição final. Com essa abordagem holística do processo de desenvolvimento de produtos sendo considerada em novas criações, amplia-se o espaço para o uso de analogias com o mundo natural, contribuindo para a divulgação e efetiva aplicação do biomimetismo no design e, assim, beneficiando concomitantemente os seres humanos e a natureza.