Espécies invasoras versus Biodiversidade

Estudos sobre a presença do javali em ambientes naturais apontam os impactos negativos da introdução de espécies não nativas no equilíbrio ecológico
Vitória Cecatto Gattis
Ana Lídia Salmazo
Paulo Henrique Marques de Andrade
vitoriagattis@gmail.com

Espécies introduzidas em um novo ambiente não estão expostas às mesmas condições de onde evoluíram originalmente. Nesse local, podem não encontrar predadores, parasitas ou competidores que existiam no seu hábitat natural, de forma que podem obter maior sucesso que as espécies nativas. Essa vantagem pode resultar na sua expansão desordenada e, por consequência, tornarem-se invasoras, podendo acarretar a exclusão de algumas espécies locais. Isso pode causar danos aos ecossistemas ao afetar diretamente a biodiversidade, pelo desequilíbrio das relações funcionais de animais e plantas, que são resultado de um longo processo evolutivo. Diversas espécies domesticadas já foram introduzidas em ambientes naturais brasileiros desde os tempos do descobrimento, causando impactos significativos. Hoje, a invasão de espécies não nativas é a segunda maior causa de modificação da composição da biodiversidade em todo mundo, atrás somente da destruição de hábitat.

Desde que a humanidade começou a expandir seu território, criou-se o costume de levar animais junto, num processo de domesticação, por meio do qual poderiam ter carne sempre a disposição e animais de companhia.

A domesticação de animais e plantas atingiu várias espécies e é uma das causas da dispersão de muitos animais fora de sua região de origem. Um exemplo atual, mas referente a acontecimentos antigos é o do javali (Sus scrofa).

O javali já domesticado pelos europeus foi trazido a América na época de sua colonização para que fosse criado para produção de carne. Entretanto, sua região de origem é a África, assim como regiões da Europa e Ásia.

     Distribuição do Sus scrofa pelo Brasil. Fonte: Pedrosa et al. 2015. Disponível em http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1679007315000092

Houve diversos momentos em que os javalis, criados como porcos domésticos voltaram para a natureza e retomaram sua condição selvagem, por exemplo, durante a guerra do Paraguai vários animais conseguiram fugir de seus cativeiros e se estabelecer novamente na natureza na região do Pantanal, onde são conhecidos por outro nome comum, porco-monteiro.

 

      Porco monteiro. Fonte: Mauro Galetti                                                                                                             

Além desse tipo de acontecimento, há outras causas que caracterizam a introdução de animais exóticos nas florestas, como a soltura proposital quando os tutores não têm mais interesse na criação. No Brasil nos anos 2000 ocorreu um episódio deste que contribuiu mais ainda com a expansão dos javalis em todo o país. Em 2015 foi publicado um artigo de autoria de Felipe Pedrosa e colaboradores em que descrevem a situação atual da dispersão do Sus scrofa no Brasil, e pode ser melhor visualizado no mapa de autoria dos mesmos.

A invasão da espécie exótica acontece a partir do momento que a espécie encontra ambiente propício para sobreviver e se reproduzir. Os javalis são animais onívoros e se alimentam de raízes, brotos, sementes e pequenos animais, dessa forma, ao chegarem ao Brasil encontraram abundância de milho e principalmente soja encontrada nas lavouras como opções de alimento, estas plantas também são exóticas no país e foram introduzidas com interesse alimentar e comercial, da mesma forma que o javali.

Como já descrito em seu artigo Felipe Pedrosa e colaboradores pontuam que na sua busca por comida, o javali revira, pisoteia o solo e reduz a cobertura vegetal ali presente. Esse hábito causa prejuízos econômicos, mas não se sabe a extensão dos prejuízos que esse hábito pode causar ao solo e a outras plantas. Por andarem em grandes bandos e se alimentarem dos vegetais de sub-bosque nas matas, depredam as plantas jovens, causando danos aos ciclos das florestas. Também ressaltam que além dos prejuízos econômicos causados à agricultura, a pecuária também pode ser afetada, uma vez que o javali pode ser fonte de doenças para outros porcos, prejudicando a produção de carne da carne suína.

Frente a esse cenário de problemas econômicos e ambientais, em 2013 o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) autorizou a caça monitorada do animal, como medida de controle. A estratégia de controle através da caça é uma medida um tanto questionável considerando que o javali tem como característica grande capacidade de dispersão territorial, como já observado em países como a França e Estados Unidos, onde a caça também é permitida. Em nenhum país onde essa medida foi adotada, houve resultado realmente satisfatório para controlar a invasão. O javali possui também alta taxa de reprodução, na qual podem nascer até dez filhotes por gestação, quepode ocorrer até duas vezes ao ano. Dessa forma, a estratégia de controle através da caça ajuda a reduzir o aumento da população de javalis, mas possivelmente não a erradicar a espécie das áreas invadidas. Como medidas adicionais de controle da população de javalis, o IBAMA suspendeu a instalação de novos criadouros e a importação de novos indivíduos, uma vez que essa foi à fonte inicial de invasão do animal. 

Cabe-nos, então, alimentar as pesquisas para elaboração de procedimentos para controlarmos não só os javalis, mas todas as espécies exóticas que ameaçam nossos sistemas ecológicos. A introdução de espécies invasoras é um fenômeno que ocorre há muitos anos e de diversas formas. Entretanto, conhecendo-se atualmente seu conhece seu impacto nos ecossistemas,medidas preventivas são necessárias para que não ocorram novas dispersões.

  

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