Diabete mellitus: controle à base de plantas

Entenda o que é a fitoterapia e como ela pode auxiliar no tratamento da diabetes
Julia Paludetti Valentim
Beatris Matos de Mello
Yuri Nishiyama Bueno Rosa
julia-valentim@hotmail.com

DOI: 10.4322/temasbio.n3.010

Fitoterapia. Fonte: Autoria de Yuri Nishiyama Bueno Rosa. 

...Na rua…

-Oi Ana, quanto tempo! Como vão as coisas?

-Tudo ótimo... E com você e o Eduardo?

-O Edu tá bem! Fazendo cursinho pra prestar vestibular no fim do ano. Eu estou mais ou menos… acredita que faz um tempo que tenho tido vontade de urinar muitas vezes em poucas horas, e mesmo bebendo muita água, minha sede não passa. Durmo muito bem pela noite, mas tenho aquela sensação de cansaço o tempo todo, sabe? Não sei mais o que fazer.

-Nossa amiga, pelo que você me disse, pode ser diabetes. Meu pai já passou por isso!

-Sério? Mas e aí? Ele toma muitos remédios para controlar a doença? É que alguns medicamentos me dão alguns efeitos colaterais... terei que tomar remédios pro resto da vida?… Estou perdida!

-Não fique assim Ana, hoje em dia, com o avanço das pesquisas, existem métodos alternativos como os fitoterápicos para você se cuidar.

-Mas como assim? Me explica melhor sobre os fitoterápicos? 

-Bem, é assim:

Segundo a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), “são considerados medicamentos fitoterápicos os obtidos com emprego exclusivo de matérias-primas ativas vegetais. Não se considera medicamento fitoterápico aquele que inclui na sua composição substâncias ativas isoladas, sintéticas ou naturais, nem as associações dessas com extratos vegetais”. Os fitoterápicos são obtidos exclusivamente de derivados do vegetal (extrato, tintura, óleo, cera, suco, e outros), com finalidade preventiva, curativa, ou para fins de diagnóstico. Ainda, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), a fitoterapia, ou medicina herbática, trata-se do mesmo processo no qual os remédios são produzidos basicamente por extratos de partes de plantas. Ou seja, ambas as organizações se referem à mesma prática, e utilizam de definições semelhantes. 

No Brasil, tratamentos com fitoterápicos tem se tornado cada vez mais comuns, podendo vir a se tornar uma alternativa de baixo custo e fácil acesso. Além disso, ao contrário do que acontece com outros medicamentos, algumas pessoas veem na fitoterapia um método de prevenção mais acessível e menos agressivo. 

Uma das doenças que já tem estudada com a fitoterapia é a diabetes melitus, que é uma doença metabólica caracterizada por hiperglicemia (quando há um excesso de açúcar no sangue), resultante de defeitos na secreção de um hormônio que nós produzimos, chamado insulina, e que controla a entrada de açúcar no sangue para nos dar energia. A hiperglicemia crônica devida a diabetes está associada a danos em longo prazo, como a disfunção e insuficiência de diferentes órgãos, especialmente os olhos, rins, nervos, vasos sanguíneos e o coração.

A doença diabetes é um mistério, e sabe-se que fatores genéticos e ambientais podem estar envolvidos, como a obesidade e a falta de exercícios físicos. Muitos medicamentos antidiabéticos têm sido desenvolvidos, mas a maioria é derivada de produtos químicos e ainda não houve nenhuma informação sobre uma possível cura da diabetes. A utilização de medicamentos, a base de plantas, para o tratamento dessa doença está ganhando importância em todo mundo. A OMS recomenda e incentiva esta prática, principalmente em países onde o acesso ao tratamento convencional da diabetes não é adequado.

A maioria das pesquisas medicinais já publicadas buscou avaliar o valor terapêutico das plantas, e com isso as propriedades antidiabéticas de algumas delas têm sido experimentalmente comprovadas, como, por exemplo, a Bauhinia forficata L. (pata-de-vaca), a Punica granatum (romã) e a Baccharis trimera (carqueja). Pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Ceará, liberados pela Dra. Glauce Viana, demonstraram que os extratos retirados da pata-de-vaca possuem uma substância chamada kaempferitrina. A kaempferitrina é um flavonoide (compostos químicos que podem ser encontrados em frutas, vegetais, chás, vinhos, chocolate etc.) que, assim como a insulina, atua na diminuição do nível de açúcar no sangue. Outros estudos com plantas do mesmo gênero Bauhinia (B. manca, B. rufescens, B. candicans, B. cheitantha e B. splenden) também têm demonstrado importantes efeitos na redução do nível de açúcar sanguíneo de animais de laboratório. Portanto, estes efeitos devem ser melhor investigados em humanos. Com relação à romã, estudos realizados por pesquisadores indianos indicaram que o extrato das folhas e das sementes desta planta também são ricos em flavonoides que podem atuar contra o diabetes. A ingestão do extrato da semente de romã pode causar uma redução em até 52% nos níveis de glicemia (concentração de açúcar no sangue), em um intervalo de 10 horas.  Ainda, em um estudo coordenado pelo Dr. Márcio Coelho da faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais, foi constatado que a carqueja também apresenta eficácia no tratamento do diabetes, reduzindo os níveis glicêmicos em ratos diabéticos, após 7 dias de tratamento (aplicação da fração aquosa da planta, 2 vezes ao dia). Detalhes dessas pesquisas podem ser encontrados na lista de Leituras Sugeridas.

Algumas instituições já citadas, como OMS e ANVISA, incentivam o uso de fitoterápicos e acreditam nessa medida, defendendo a ideia de que o avanço desse método alternativo irá valorizar a biodiversidade do país, aquecer a indústria dos fitoterápicos e dar às pessoas mais opções terapêuticas. Entretanto, como qualquer outro medicamento, o uso desse método alternativo também pode causar efeitos colaterais, como alterações na pressão arterial e problemas no sistema nervoso. Ou seja, os cuidados ao tomar um remédio são os mesmos cuidados que devemos ter ao consumir um fitoterápico, como adquirir medicamento apenas em farmácias autorizadas pela Vigilância Sanitária, seguir orientações da bula, observar data de validade, seguir as indicações de armazenamento, entre outras. Alguns fitoterápicos só podem ser vendidos com indicação médica, e com isso podem ser manipulados em farmácias, devendo constar sua fórmula na Farmacopéia Brasileira.

Os medicamentos tradicionais também têm um potencial para formar uma variedade de fármacos que possivelmente controlam a diabetes, por isso não se pode perder as informações sobre eles. Por outro lado, há uma grande necessidade de documentar e avaliar o poder dos fitoterápicos como uma terapia alternativa. É importante destacar, que quanto mais interesse a população tiver pelos fitoterápicos, mais eles serão pesquisados e assim teremos sua validação científica e poderemos descobrir novos medicamentos para tratar e até, possivelmente, curar a diabetes, além de outras doenças, a partir das plantas.

 

Leitura Sugerida

  • Borges KB, Bautista BH, Guilera S. Diabetes–utilização de plantas medicinais como forma opcional de tratamento. Revista Eletrônica de Farmácia. 2008; 5(2).
  • Cecílio AB, Resende LB, Costa AC, Cotta MM, Giacomini LF, et al. Espécies vegetais indicadas no tratamento do diabetes. Revista Eletrônica de Farmácia. 2008; 5(3): 23-8.
  • Lino CDS, Diógenes JPL, Pereira BA, Faria RAPG, Andrade Neto M et al. Antidiabetic activity of Bauhinia forficata extracts in alloxan-diabetic rats. Biological and Pharmaceutical Bulletin. 2004; 27(1):125-127.
  • Ankita P, Deepti B, Nilam M. Flavonoid rich fraction of Punica granatum improves early diabetic nephropathy by ameliorating proteinuria and disturbed glucose homeostasis in experimental animals. Pharmaceutical biology. 2015; 53(1): 61-71.
  • Das AK, Mandal SC, Banerjee SK, Sinha S, Saha BP et al. (2001). Studies on the hypoglycaemic activity of Punica granatum seed in streptozotocin induced diabetic rats. Phytotherapy Research. 2001; 15(7): 628-629.
  • Oliveira ACP, Endringer DC, Amorim LAS, Maria das Graças LB, Coelho MM. Effect of the extracts and fractions of Baccharis trimera and Syzygium cumini on glycaemia of diabetic and non-diabetic mice. Journal of Ethnopharmacology. 2005;102(3):465-469.