Alternativas aos antibióticos no combate às superbactérias

Pesquisas recentes buscam antimicrobianos diversificados para nos munir na guerra contra as superbactérias
Isabela Fernanda Morales Martins
Patricia da Silva Lima
isamoralesmartins@gmail.com

 

Estamos perdendo uma guerra contra inimigos invisíveis. Quando antibióticos são introduzidos no ambiente em que as bactérias vivem, é uma habilidade natural que elas resistam a essas drogas - luta pela sobrevivência. O problema é grande, quando tais bactérias apresentam níveis elevadíssimos de resistência a qualquer tipo de antibacterianos específicos para o seu tratamento e se tornam impossíveis de matar. Esses microrganismos são chamados de “superbactérias”. É o momento que começamos a perder a guerra contra esses inimigos.

A taxa de mortalidade das bactérias quando submetidas pela primeira vez a um antibiótico tende a ser elevada, e são poucas as que sobrevivem dentro de uma população de bilhões de indivíduos. As que permanecem vivas possuem uma característica genética que é responsável por tal resistência, que será espalhada pelas futuras gerações. A frase “De médico e louco todo mundo tem um pouco” apesar de bem popular, merece muita atenção. A seleção de bactérias resistentes a antibióticos se dá pelo uso inadequado de antibióticos, com comportamentos cotidianos de esquecer de ingerir o remédio, ou não o ingerir no período determinado pelo médico, ou pelo uso excessivo dessas drogas. Esses fatores fazem com que haja um aumento na pressão seletiva, fazendo com que as bactérias mais fortes e resistentes sejam selecionadas.

Inicialmente, tal fenômeno de resistência bacteriana não demonstrava ser um problema muito grande, já que foi resolvido temporariamente com a introdução de novos agentes antibacterianos. No entanto, a velocidade com que as bactérias desenvolvem resistência aos antibióticos é maior do que a velocidade da produção de novos medicamentos. Por essa razão, muitas infecções bacterianas se tornaram impossíveis de tratar, o que é uma questão de grande preocupação mundial de saúde pública. Métodos alternativos ao uso de antibióticos estão sendo desenvolvidos para matar as bactérias e solucionar a problemática da resistência bacteriana, os chamados SNAPPs (Structurally Nanoengineered Antimicrobial Peptide Polymers - polímeros de peptídeos antimicrobianos estruturados por nanoengenharia) são um bom exemplo.

SNAPPs, uma nanopartícula promissora

Alguns grupos de pesquisadores ao redor do mundo estão em busca de novas armas para o combate das superbactérias. Shu Lam, uma estudante de pós-doutorado de apenas 25 anos, é protagonista de um desses grupos, comandado pelo engenheiro químico e biomolecular Greg Qiao da Universidade de Melbourne, Austrália. Preocupados com a crise na saúde mundial causada pelas superbactérias, o grupo desenvolveu, em 2016, moléculas em formato de estrela capazes de matar bactérias denominadas pelos autores de SNAPPs. Essas nanopartículas, são construídas com cadeias de aminoácidos (moléculas que fazem parte das proteínas) chamadas de polímeros de peptídeos e podem ter 16 ou 32 “braços”. Diferente dos antibióticos, estes antimicrobianos são capazes de atacar as bactérias de múltiplas formas, diminuindo a capacidade do desenvolvimento de resistência. Em bactérias Gram-negativas, bactérias que possuem uma parede celular composta por uma camada de peptideoglicano (polímero de carboidratos e peptídeos) e uma membrana externa constituída por proteínas e lipopolissacarídeo (lipídio ligado a uma cadeia de carboidratos), o contato com essas moléculas pode causar desestabilização e fragmentação dessa membrana externa. Em seguida os SNAPPs atravessam a membrana plasmática, provocando uma perturbação que pode levar a bactéria à morte.

Lam e sua equipe testaram esses antimicrobianos em formato de estrela contra diversas bactérias, incluindo superbactérias colistina e multidroga resistente (CMDR) Pseudomonas aeruginosa e Acinetobacter baumannii. Além de serem eficientes contra todas as bactérias testadas, as nanopartículas não promoveram o desenvolvimento de resistência na CMDR A. baumannii em um experimento específico para isso. Os benefícios dessas moléculas não param por aí. Quando feitos testes em camundongos infectados com a mesma superbactéria, o tratamento com as nanopartículas também aumentou o número de neutrófilos (células de defesa do hospedeiro) no local da infecção. Portanto, além de atacarem diretamente a superbactéria infectante, os SNAPPs ainda fizeram com que o próprio organismo do hospedeiro atacasse rapidamente. Logo, devido a todas as suas peculiaridades, essas moléculas antimicrobianas são altamente promissoras e podem ser grandes aliadas na luta contra as superbactérias resistentes. Entretanto, as pesquisas ainda estão em estágios iniciais e serão necessários alguns anos e muito investimento para essa nanopartículas chegarem ao mercado.

Teixobactin, um novo antibiótico de ação diferenciada

Apesar do desenvolvimento de métodos alternativos, os antibióticos não precisam ser totalmente excluídos da guerra contra as superbactérias. A dificuldade em encontrar novos antibióticos pode estar no modo de procura. A maioria dos antibióticos provém de microrganismos do solo, porém, o grande problema está no fato de que bactérias do solo são muito difíceis de serem cultivadas em laboratório. Mas isso pode estar mudando. Recentemente, uma equipe de pesquisadores liderada pelo microbiologista Kim Lewis da Northeastern University, em Boston – Massachusetts, desenvolveu métodos inovadores de cultivo de bactérias de solo. A partir dessas técnicas, eles foram capazes de isolar uma bactéria que produz uma substância antibiótica, a qual deram o nome de “teixobactin”. Esse antibiótico se mostrou promissor por ser eficiente e não induzir resistência nas superbactérias testadas devido ao seu modo de ação diferenciado. Logo, o desenvolvimento de novas técnicas de cultivo nos permitirá explorar a imensidão de microrganismos ainda não explorados em busca de novos antibióticos.

Assim, considerando a problemática da resistência bacteriana aos antibióticos e as consequências que esse fenômeno acarretará à saúde mundial, torna-se extremamente necessário o investimento e desenvolvimento em novas pesquisas que busquem métodos alternativos eficazes para o combate das superbactérias.

 

Leituras Sugeridas

  • Lam SJ, O'Brien-Simpson NM, Pantarat N, Sulistio A, Wong EHH, et al. Combating multidrug-resistant Gram-negative bacteria with structurally nanoengineered antimicrobial peptide polymers. Nature Microbiology. 2016;11(1):1-11.
  • Ling LL, Schneider T, Peoples AJ, Spoering AL, Engels I, et al. A new antibiotic kills pathogens without detectable resistance. Nature. 2015; 517: 1-4.
  • Tortora GJ, Funke BR, Case CL, eds. Microbiologia. Pp.554-582. 10 ed. Porto Alegre, Editora Artmed, 934p. 2012.